Função pulmonar e sintomas atópicos em crianças de 3 a 7 anos submetidos a diferentes ambientes intrauterinos e perinatais

Abstract

Introdução: A teoria das origens do desenvolvimento da saúde e da doença (DOHaD) sugere que eventos ocorridos no útero e/ou no início da vida podem impactar na saúde infantil. Este é um período de vasta organogênese, durante o qual exposições adversas podem interferir e alterar a trajetória do desenvolvimento dos sistemas. A exposição intrauterina à nutrição materna desequilibrada, hiperglicemia, a inflamação sistêmica materna, toxina da fumaça do tabaco e estresse oxidativo; podem levar a alterações estruturais e maturacionais pulmonares e imunológicas, além de mudanças epigenéticas, resultando em um padrão hiper-reativo pulmonar e atópico. Objetivos: Avaliar o impacto das variações intrauterinas sobre a função pulmonar e a prevalência de sintomas atópicos em pré-escolares brasileiros expostos a diferentes ambientes intrauterinos (doença hipertensiva específica da gestação [DHEG], hiperglicemia na gravidez [DMG], tabagismo gestacional [TOB], restrição de crescimento intrauterino [RCIU-PIG]) comparando-os a um grupo controle. Métodos: Estudo transversal aninhado a uma coorte múltipla prospectiva e controlada, com díades recrutadas do estudo IVAPSA I e entrevistadas durante o período pré-escolar. Foram coletados dados de saúde da díade, dados perinatais das crianças (tipo de parto, idade gestacional, Apgar, sexo, peso ao nascer, comprimento e perímetro cefálico), medidas antropométricas maternas e infantis; status socioeconômico familiar; avaliação da função pulmonar (por meio da espirometria) e avaliação de sintomas de asma, rinite e eczema (através do ISAAC). Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, e os responsáveis legais pelas crianças participantes foram devidamente informados sobre os objetivos, procedimentos e potenciais riscos e benefícios do estudo, fornecendo consentimento livre e esclarecido. Resultados: Um total de 130 díades foi analisado. Em relação à função pulmonar, as crianças do grupo DMG apresentaram menor média de VEF0,75 e CVF, as do grupo RCIU-PIG tiveram menor média de CVF, e as do grupo DHEG apresentaram maiores fluxos, porém com Índice de Tiffeneau inferior. Quanto aos sintomas atópicos, observou-se uma alta prevalência de sintomas de asma (79%), asma ativa (59,2%), sintomas de rinite (53,1%) e de eczema (73,3%). O grupo TOB apresentou diferença estatisticamente significativa em relação aos demais grupos no módulo rinite, tanto na presença de sintomas de rinite quanto de rinite ativa (p=0.009 e 0.017 respectivamente), bem como no escore global de rinite (p=0.003). Observou-se também uma correlação negativa entre o escore global da asma e o Índice Tiffeneau, bem como seu z-escore. Conclusões: Fatores metabólicos maternos e exposição intrauterina a ambientes adversos, como os encontrados no DMG, DHEG e RCIU-PIG, resultaram em alterações na função pulmonar dos pré-escolares brasileiros. Os ambientes DMG, DHEG e TOB também foram associados a uma maior prevalência de sintomas atópicos nos escolares avaliados.

Introduction: The Developmental Origins of Health and Disease (DOHaD) theory suggests that events occurring in the womb and/or early life can impact child health. This is a period of extensive organogenesis, during which adverse exposures can interfere with and alter the developmental trajectory of systems. Intrauterine exposure to unbalanced maternal nutrition, hyperglycemia, maternal systemic inflammation, tobacco smoke toxins, and oxidative stress can lead to structural and maturational alterations in pulmonary and immune systems, as well as epigenetic changes, resulting in a hyperreactive pulmonary and atopic pattern. Objectives: To evaluate the impact of intrauterine variations on lung function and the prevalence of atopic symptoms in Brazilian preschoolers exposed to different intrauterine environments (gestational hypertension [HDP], gestational diabetes [DMG], gestational smoking [TOB], and intrauterine growth restriction [RCIU-PIG]) comparing them to a control group. Methods: Cross-sectional study nested within a controlled, prospective multiple cohort, with dyads recruited from the IVAPSA I study and interviewed during the preschool period. Health data from the dyad were collected, as well as perinatal data of the children (type of delivery, gestational age, Apgar score, sex, birth weight, length and head circumference); maternal and infant anthropometric measurements; family socioeconomic status; assessment of lung function (via spirometry) and evaluation of asthma, rhinitis, and eczema symptoms (through ISAAC). This study was approved by the Ethics Committee of the Hospital de Clínicas de Porto Alegre, and the legal guardians of the participating children were appropriately informed about the objectives, procedures, and potential risks and benefits of the study, providing informed consent. Results: A total of 130 dyads were analyzed. Regarding lung function, children in the DMG group showed lower mean FEV0.75 and FVC, those in the RCIU-PIG group had lower mean FVC, and those in the HDP group exhibited higher flows but a lower Tiffeneau index. Regarding atopic symptoms, a high prevalence of asthma symptoms (79%), active asthma (59.2%), rhinitis symptoms (53.1%), and eczema (73.3%) was observed. The TOB group showed a statistically difference compared to other groups in the rhinitis module, both in the presence of rhinitis symptoms and active rhinitis (p=0.009 and 0.0017, respectively), as well as in the global rhinitis score (p=0.003). A negative correlation was also observed between the overall asthma score and the Tiffeneau index, as well as its z-score. Conclusion: Maternal metabolic factors and intrauterine exposure to adverse environments, such as those found in DMG, HDP, and RCIU-PIG, resulted in alterations in the lung function of Brazilian preschoolers. The DMG, HDP, and TOB environments were also associated with a higher prevalence of atopic symptoms in the assessed schoolchildren.